Muitos trabalhadores rurais que exerceram alguma atividade urbana ao longo da vida acreditam que perderam definitivamente o direito à aposentadoria rural por idade. Essa interpretação é comum, mas não é verdadeira.
A Súmula 46 da Turma Nacional de Uniformização deixou claro que o período urbano intercalado não impede a concessão da aposentadoria rural, desde que a condição de segurado especial continue configurada no caso concreto.
O entendimento consolidado pela TNU evita injustiças e reconhece a realidade de milhares de famílias rurais que precisam buscar empregos temporários fora do campo para sobreviver.
O que é a aposentadoria por idade rural e quem tem direito?
O artigo 48 da Lei 8.213 de 1991 garante o benefício para homens a partir de 60 anos e mulheres a partir de 55 anos, desde que comprovem o exercício de atividade rural, mesmo de forma descontínua, por período equivalente à carência exigida.
O § 2º da lei deixa claro que a prova da atividade pode ser feita de forma não contínua, acompanhando a dinâmica agrícola, que naturalmente possui intervalos entre plantio, colheita e períodos de estiagem.
Além disso, o artigo 143 da mesma lei reforça a aceitação da descontinuidade para quem busca a aposentadoria rural por idade.
Atividade urbana intercalada não elimina a condição de segurado especial
A Súmula 46 da TNU consolidou uma regra essencial para milhares de trabalhadores.
A presença de períodos urbanos, por si só, não descaracteriza o trabalhador como segurado especial. O que realmente importa é:
• a atividade rural deve permanecer como principal fonte de subsistência do grupo familiar
• o trabalho urbano deve ser episódico, motivado por necessidade econômica
• não pode existir ruptura definitiva com o meio rural
Em outras palavras, o que prevalece é o vínculo essencial do segurado com a vida campesina.
A Lei 11.718 de 2008 e o parâmetro dos 120 dias
A Lei 11.718 incluiu o § 3º no artigo 48 e introduziu um parâmetro objetivo: considerar descontínua a atividade rural quando a interrupção não ultrapassar 120 dias por ano, corridos ou intercalados.
Esse limite funciona como referência, mas não como regra absoluta. Ele não pode ser aplicado de forma rígida porque:
• o ano civil não corresponde ao ciclo agrícola
• regiões diferentes possuem períodos de plantio e estiagem distintos
• longos períodos sem chuva podem obrigar o rurícola a buscar trabalho urbano por mais tempo
O julgador deve analisar cada caso, considerando a realidade econômica e climática da região.
Aposentadoria rural híbrida quando a carência rural não é completada
Quando o trabalhador rural não consegue cumprir toda a carência exclusivamente no campo, mas possui contribuição em outras categorias, a lei permite a aposentadoria híbrida.
Nesse caso, o benefício só pode ser pedido na idade urbana, que é:
• 65 anos para homens
• 60 anos para mulheres
A aposentadoria híbrida mistura períodos rurais e urbanos e utiliza a idade urbana como requisito final.
Quando o trabalho urbano impede a aposentadoria rural
A atividade urbana só impede a aposentadoria rural em situações como:
• abandono definitivo da agricultura
• vínculo urbano contínuo e estável por muitos anos
• renda urbana superior e predominante sobre a renda rural
Se o trabalho rural deixa de ser a base da subsistência familiar, o segurado perde a condição de segurado especial.
Trabalho rural e urbano ao mesmo tempo: é possível ser segurado especial?
Sim. A legislação e a jurisprudência admitem que, mesmo com atividades mistas, o segurado continue sendo considerado especial, desde que:
• o trabalho no campo seja o responsável pela subsistência familiar
• a atividade urbana seja secundária ou complementar
• não haja predominância econômica da renda urbana
Isso significa que é plenamente possível exercer função urbana por alguns meses, retornar ao campo e manter o direito à aposentadoria rural por idade.
Então a aposentadoria rural não exige exclusividade absoluta no exercício de atividade campesina. A Súmula 46 confirmou uma interpretação mais humana e realista da lei, permitindo que o segurado especial mantenha seu direito mesmo com breves períodos urbanos.
O que importa é a essência da vida laboral: se o campo continua sendo o eixo central da renda e da rotina da família, a aposentadoria rural permanece garantida.
